Per Aspera Ad Astra: A história do mais querido do mundo (Capítulo IV)
Per Aspera Ad Astra
Por Filipe Martins Gonçalves
O leitor que acompanhou esta coluna deve ter notado que há uma preocupação constante de resgatar a raiz do Corinthianismo.
Mas que é Corinthianismo?
Será que é possível explicar? Acho que não…
Ainda assim, podemos identificá-lo. É mais ou menos o elemento sem o qual teria sido impossível a existência, por exemplo, de um Neco, de um Idário, que são figuras mais que emblemáticas, por exercerem este elemento essencial em toda sua plenitude.
O Corinthianismo tem uma razão de ser que não se perde no efêmero. Não é definido pelo o que tem, mas define cada vitória, cada glória e cada derrota. É só pensarmos o que foi aquele dia 13 de outubro de 1977.
Nenhuma vitória mexe tanto com o mundo quanto a vitória do Corinthians. Isso também faz de suas derrotas algo maior que as vitórias dos rivais.
O que o Corinthianismo é não vem de nada exterior a ele. Pelo contrário, é ele a referência para os outros.
Corinthianismo é, portanto, uma essência, que diferencia o Corinthians dos outros clubes.
O Corinthians é uma Torcida que tem um Time, eis a conceitualização mais concreta a que se pode chegar de Corinthianismo.
Pois aqui precisamos buscar entender a razão histórica desse elemento.
Note que o termo elemento apenas designa uma generalização, pois não há definição concreta para Corinthianismo.
A intenção, ou mera pretensão, é conseguirmos identificar com alguma precisão este elemento no final desta série de colunas.
Para entendermos a dimensão do Fenômeno Corinthians, é preciso compreender a dimensão do próprio Futebol.
Estão contidas, neste arquétipo que é o Futebol, desde a noção de herói, que é ligada diretamente à guerra, até a noção de pertencimento a uma coletividade.
Não à toa podemos dizer que o Futebol, sem ser ainda o Futebol, começou em um campo de batalha, ou de disputa em algum nível.
É coisa antiga da humanidade, a simulação da guerra.
Pensando bem, até os primatas fazem isso. E, se formos ver realmente, todo animal o faz.
Tanto é assim que encontramos um Futebol na China semelhante ao Futebol de hoje, bem antes dele existir no mundo ocidental.
No ocidente a disputa se tornou grandiosa na cultura helênica. O arquétipo foi “domesticado” nas Olimpíadas, por exemplo. Mas nas vilas medievais, os costumes eram um tanto mais “bárbaros”.
Claro que os ânimos sempre se exaltavam. A violência sempre esteve presente, e sempre fez parte, pela natureza do arquétipo.
O objetivo de levar algum objeto para o outro lado da rua foi a origem do Calcio. Mas jogos semelhantes aconteciam em toda a Europa medieval, especialmente nas datas festivas, quando a cidade toda estava em procissão, por exemplo.
Era questão de decreto do Rei, e a prática estava proibida, especialmente na Inglaterra.
O Futebol, porém, não desiste, simplesmente por ser um arquétipo verdadeiro e essencial, assim como o Corinthianismo.
Os seminaristas trataram de criar um ambiente, com regras, para a prática desses jogos. As universidades, portanto, são fundamentais para que o Futebol aconteça.
De início, o futebol era jogado com as mãos. E não voltava ninguém inteiro para a aula.
A Inglaterra, que de tanto proibir a prática acabou por ‘esquecê-la’, recrutou seminaristas italianos para desenvolver a prática do Calcio, que não deixou de existir na bota.
A idéia dos ingleses era diferenciar este “novo” jogo daquele que era jogado também com as mãos. Acharam que se tirassem as mãos do jogo, a coisa seria menos, digamos, violenta.
Fundada a Associação de Futebol em 1846, o Football se diferenciava do Rugby, e o esporte serviu muito bem à revolução industrial em curso. Era preciso uma atividade de massa. E isso o Futebol sempre foi.
Extrapolou as universidades, foi para as fábricas, para os bairros. Em pouco tempo o esporte foi disseminado pelo mundo.
A primeira grande evolução ocorreu na Escócia.
Durante muito tempo a Inglaterra tomou surra em campo, pois os escoceses tinham tática mais apurada e técnica mais desenvolvida. Tocavam a bola de pé em pé, ao invés de jogar a bola longe e sair correndo atrás dela, como os ingleses faziam até então.
Note que esta forma de jogo é muito comum no Rugby, mas pouco inteligente no Futebol, ainda mais quando olhada com os olhos contemporâneos.
E novamente na Universidade, o Futebol viu sua grande evolução.
Um clube foi fundado com o intuito de revolucionar a maneira de jogar dos ingleses, e se tornou nada menos que o Embaixador do esporte bretão, e ganhou brasão da Coroa.
De 1882 em diante, a Inglaterra iniciava, no Futebol, a Era Corinthiana. Não é megalomania deste Corinthiano que escreve. É História. Está aqui. É o Corinthian Football Club, que se traduziu em hegemonia inglesa no Football. E internacionalizou de vez o esporte conforme a Associação inglesa o planejara.
Enfim, esse Embaixador veio a Piratininga no instante em que o Povo engrenava um clube.
Goleou os times do futebol “oficial” e foi fonte de inspiração no ano do Cometa.
Mas atenção ao povo “engrenando um clube”.
Já existia Futebol nas nossas várzeas, desde quando os seminaristas de Itu trouxeram o esporte. Ou desde que Charles Miller chegou com sua bola e seu livro de regras, ali no Bom Retiro, no mesmo lugar onde foi fundado o Timão do Povão, mais de duas décadas depois.
O que precisa ficar claro é que o Povo já sabia jogar bola, e já jogava com muita propriedade.
O Futebol do Povo tinha seus campos de batalhas quando os rios davam uma trégua. Os ‘moleques’ refinavam suas técnicas na terra molhada e ressecada das Várzeas, onde as formigas lava-pés erguiam seus formigueiros, como impérios sorrateiros que se espalhavam. E os clubes da Várzea eram assim, pequenos Impérios, donos de suas Várzeas. Que partem para a “briga”, vai à luta. Foi nesse berço que o Corinthians nasceu.
O Futebol restrito aos clubes “oficiais”, às Ligas “oficiais”, estava em franca decadência no momento em que o Corinthians surgia. Portanto, o Corinthians não é um fenômeno isolado em sua época, tem uma razão concreta para existir, e uma raiz profunda na História da humanidade.
Mas o fato de ter devolvido o Futebol ao Povo, ao colocar o Povo de volta no controle do Futebol já diz muito sobre o que é o Corinthianismo. Veremos como isso aconteceu…
Postar um comentário
Se você é Porco, Sardinha, Bambi ou torcedor de qualquer outro time de menor expressão e quer que seus comentários sejam aprovados, escolha bem suas palavras.
O blog é sobre o Corinthians e eu sou chato pra caralho.