sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Per Aspera Ad Astra: A história do mais querido do mundo (Parte XXXVI e última)

Salve, Nação!

Hoje posto aqui o último capítulo da série "Per Aspera ad Astra".
Quero reiterar os meus mais sinceros agradecimentos ao Filipe do Anarcorinthians, não só pela permissão pra que eu postasse os textos de autoria dele aqui, mas principalmente pelo trabalho incansável e incontestável na preservação da memória Corinthiana.
Conheçam o blog do cara e acompanhem o trabalho dele também na Rádio Coringão. Vale a pena demais.

O Time do Povo
Por Filipe Martins Gonçalves

Encerramos essa série, que pretendeu contar boa parte da História mais bela que a humanidade já forjou, com uma espécie de reflexão.

Pois a História do Corinthians é mais que emblemática. É, em sua completude, a História da emancipação popular, em uma sociedade de extrema desigualdade.

O Futebol está enraizado na cultura brasileira, porque o maior Timão das Várzeas do começo do século XX alçou o Futebol dito oficial.

E a Várzea é a prova de que Futebol não é apenas um esporte, não é apenas um elemento civilizatório das sociedades modernas e industrializadas. O ludopédio está para a raça humana assim como os campos de batalha estão para os guerreiros. E a Várzea, esse solo sagrado onde as artimanhas de moleque eram levadas em pé-de-guerra, é o berço do Futebol de linhas curvas, da ginga com a bola, e da picardia do Futebol de verdade. Era a continuação da brincadeira de rua.

De forma que sem a História do Corinthians, o Futebol dito “oficial” dificilmente teria deixado de ser um passatempo para a alta sociedade. O Corinthians rompeu esta barreira, e foi além. Quando a Seleção varzeana, que foi o Coringão em sua infância, leva toda essa extensão da brincadeira de rua, do campinho onde se aprendia o Futebol descalço, para o Velódromo, o Futebol brasileiro passa a ser definitivamente do Povo. A elitização vem desde este ponto, como reação a essa verdadeira Revolução Corinthiana.

O Corinthians foi fundado durante a consolidação dos sindicatos operários, em sua maioria efeito de contestação pontual de ativistas operários das metrópoles brasileiras. Seu primeiro presidente, Miguel Battaglia, teve um histórico de agitação na massa operária. O Corinthians era feito pelas mãos ásperas do Povo, do operário, do trabalhador braçal, dos autônomos que lutavam pelo pão de cada dia. Quando foi criado o Clube do Povo, o Club de verdade, para passar por cima dos almofadinhas (pois era essa a agitação daquela turma, esse era o propósito e o intuito nascido na Utopia sob a luz do Cometa, em maio, na praia do rio Tietê, ao som da seresta...), Miguel estava "refugiado" na profissão de alfaiate. Os imigrantes chegavam já com profissões, antes de ir para lavoura ou para fábrica. Menos de um mês na Presidência, ele se mudou para Piracicaba. Estaria sendo vigiado?...

A História do Corinthians é repleta de exemplos que comprovam o incômodo que ele causa. A massa popular, que com Ele vai onde Ele for, já deixava as madames de cabelo em pé desde 1913.

Quando o Corinthians eleva o Futebol varzeano para o Futebol "oficial", em 1913, no mês de março, nasce o anticorintianismo 'constatável'. As maledicências permeiam as vozes da imprensa, que passa agir sobre o Corinthians como os abutres sobre uma carniça. Mas no caso a carniça era mais forte, e o pequeno Corinthians se fez Gigante.

Campeão em 14, foi alijado da disputa do ano seguinte através de uma rasteira. Imaginavam que assim acabariam com essa agitação popular. Sem a renda de seus jogos, o Corinthians não faliu porque passava o chapéu nas fábricas, nos comércios, entre o Povo.

E neste mesmo ano, os jogadores voltam para o Corinthians; prova de amor. Não é demais imaginar que em nenhum clube do mundo isso aconteceria.

Em 1916, no começo do ano, enfrentou os campeões de 1915; os organizadores da Taça Beneficência Espanhola escolheram o Corinthians porque senão não teria viva alma para assistir o jogo entre o Germania e a A.A. das Palmeiras...

E o Corinthians meteu 3 a 0 e 4 a 1, respectivamente. Por isso "Campeão dos Campeões". Quando foi que alguém da imprensa ressaltou esse fato gigantesco, prova de grandeza em uma época difícil, que o Corinthians tinha nada além do amor da Torcida, que é até hoje a "Torcida que tem um Timão"!

Campeão novamente. Novamente invicto. Vencendo todos os seus jogos.

O Presidente, sr. Alexandre Magnani, era cocheiro de Tilburi, espécie de taxista na época. E o Corinthians, na imprensa que chamava o Paulistano de "nossos moços", era chamado de "clube de carroceiro". Isso por si só é o exemplo cabal da difamação sistemática que o clube dos "desdentados", "favelados" sofre ao longo de toda sua existência... Mas não pára por aí. Ao longo do tempo conseguiram fazer crer em todas essas bobagens boa parte da população. Temos exemplos piores, posteriormente, mas a idéia é sempre essa.

Só em 1917 acontece uma greve geral no Brasil, fruto da maturação do processo reivindicatório de direitos trabalhistas e mais além disso, impulsionada por idéias anarco-sindicalistas.

E o maior dos anarco-sindicatos da época era o... Corinthians!

No Campo que o Corinthians mantinha na raça, ao lado do Parque da Luz, os Corinthianos escreviam "pão, terra e liberdade". Para deixar em choque a alta sociedade que fazia seus saraus do outro lado da rua. Poderá observar que nessa época, com a Paulista já bem formada com seus casarões, os saraus passaram a acontecer no Trianon... A elite abandonava a cópia do Parc des Princes parisiense...

Enfim, os times de Dona Florinda ("vamos, Quico, não se misture com essa gentalha") faliram diversas vezes. Viram o poderio do Clube do Povo sobrepujar suas merrecas em 1922, ano do Centenário da Independência... Para completar, o Corinthians foi campeão em seis dos dez campeonatos disputados na década de 20.

Resultado? O Paulistano abandona o Futebol. Os orfãos de Dona Florinda criam uma instituição para sempre preferencial freguesia do Corinthians... O esforço para fazer esse clube ser vitrine alguma coisa envolveu as mais altas esferas do poder público. E o Corinthians, em nome do Povo, que fez? Transformou em freguesia.

Recentemente, o Corinthians ficou um bom período sem ganhar delas. A imprensa criou o estigma de freguês, elas desvirtuaram nosso cântico "Corinthians minha vida, minha história, meu amor", num exemplo claro de alienação histórica. Mas o curioso está agora: hoje, faz os mesmos tantos que elas não ganham de nós, mas a imprensa não decalca esse fato como fariam se fosse o contrário.

O Futebol é público, e tudo que é público é também Político.

O Corinthians, logo de cara, mostrou a que veio, devolveu o Futebol ao Povo. E, para completar, foi ser poliesportivo como nenhum outro Clube do Brasil. Nenhum clube brasileiro acumula tantas glórias em esportes tão variados, como basquete, remo, natação, handebol, futsal, tamboréu, peteca, judô...

Até hoje existe o esforço colossal de se diminuir isso. Mas na História do Corinthians tudo é forjado pela Mística. Que começa na raiz dessa gigantesca árvore, a Fiel Torcida, e envolve todos os guerreiros que lutam por este Manto Sagrado, em todas as modalidade e idades.

O Futebol não é apenas esse esporte profissional gerador de lucros para investidores, essa imagem que nos é “vendida” em todo lugar. Tampouco é o território bárbaro da violência. Enquanto os investidores bancam essa imagem falsa da violência, o povo perde seu espaço nas Arquibancadas. E o Futebol vai sendo aos poucos transferido do terrão, da rua, para o gramado sintético das escolinhas. Muita gente ganhando, clubes vendo o bonde passar, e em pouco tempo voltamos ao estágio de antes de 1913, e até pior. O controle do Futebol é uma obssessão da alta sociedade, desde o ocaso de 1913, quando o Coringão devolveu o Futebol ao Povo.

E a bola, a Deusa Bola, é incontrolável...

E não é alcançada por quem não a tem por paixão, e por isso não a merecerão jamais; daqueles que a transformam em “produto comercial” como desculpa para tentar atingir esse controle elitista. Mas ela é, de fato, um instrumento sacralizado da domesticação do conflito ancestral da humanidade. Não é guerra, e não é brincadeira. É Futebol. Ou, como diziam os japoneses que praticavam Kemari, ludopédio antigo, a bola representa o próprio Sol. A metáfora é verdadeira, sem Sol não há vida; sem a Deusa Bola, a vida seria impossível.

E ela pertence ao povo, e como o próprio Sol, não distingue cor ou credo. Ela é da humanidade. E o homem cria seus mitos, suas religiões. O Povo Corinthiano foi o primeiro a criar seus mitos, numa religião e através de sua voz, o Corinthians.

Mas o povo está sendo colocado para fora de campo, sem nem ao menos se dar conta, de tão vidrado que está na telinha do plim-plim.

Tudo é pela modernidade do Futebol... É para coibir a violência... Selecionar o público... Dar conforto a quem pode consumir...

E o Futebol? E a Torcida? Antes de existirem os alambrados, existiam cercas. Para ganhar uma renda maior, os clubes disponibilizavam cadeiras entre as quatro linhas e as cercas. Sem proteção nenhuma, como em uma roda de Capoeira Angola. Mas agora, o padrão FIFA requer uma placa transparente, como um aquário. Isola-se o torcedor do campo. E ainda que a distância seja milimétrica, é crucial, delimitadora, mordaz.

Uma camisa de força, uma mordaça. Mesmo que o torcedor já esteja sendo selecionado pelo custo alto do ingresso, em uma sociedade de poder aquisitivo ridículo. Por isso o plim-plim, aliado dos empresários que acometeram o Futebol e favorecidos pelo poder público, tende a vencer se deixarmos. Já convenceu a todos de que torcedor é bandido. Criminalizando o torcedor, e não o cidadão que pratica barbaridades por inúmeros outros motivos alheios ao Futebol, facilmente se convence da falsa necessidade de elitização.

E não adianta sugerir motivos financistas para aumentar o preço dos ingressos, nem para sanar dívidas. Afinal, clubes mais endividados e com menos patrocínios conseguem contratações através dos empresários, sem que a imprensa faça nenhum alarde, como faria se fosse o Corinthians. Ainda que o desavisado esteja ‘convencido’ que o Corinthians é o único clube “endividado” do mundo...

O que os empresários estão fazendo é transformar o Futebol brasileiro em mera vitrine, geradora de lucros para eles. Assim, nosso Futebol local se enfraquece diante do Futebol português, turco, etc. O grande passo para essa “conquista” foi justamente o apoio dos dirigentes de clubes brasileiros, que fingem melhorar o faturamento aumentando o preço do ingresso, e afastam o Torcedor promovendo a elitização.

E certo dirigente tentou ser malandro, e fez cair no colo da Torcida mais mobilizada do país uma questão que precisamos resolver. Criaram a idéia na cabeça da população desavisada de que a “parceria” que Dualib tentou atrair é um problema.

Mas o problema é a tal da lei, o problema é a figura do empresário dominando o cenário futebolístico. Esse convencimento regado a lavagem cerebral midiática é arquitetado e vem a calhar com os propósitos da anticorintianada, desde 1913.

Aquele playboy iraniano está faturando alto pelo mundo, negocia de inúmeras maneiras com diversos clubes do Brasil e do mundo, mas se algo ligar ele à imagem do Corinthians, a lavagem cerebral volta com força total. De forma semelhante a esse empresário, existem inúmeros, com os mesmos procedimentos. Envolvidos em todos os clubes. Mas a imprensa faz questão de deixar passar batido.

Muitos dirigentes agem amadoristicamente, com a anuência da mesma imprensa que já quis imputar a imagem de “arcaico” ao Corinthians. Imaginem se um Presidente do Corinthians, em pleno século XXI, negocia seus cavalos para ajudar o clube? Seria um escândalo, não é mesmo?

Cuidado, Corinthiano(a). Estão querendo te fazer pensar que o Futebol moderno é o certo, e só o Corinthians é o problema. Percebe?

Ou ele é “arcaico” (coisa que nunca foi), ou ele faz coisa errada, quando não faz mais do que todo mundo faz, e faz bem menos pior que muitos outros clubes que a imprensa adora puxar o saco.

O Corinthians completará seu primeiro Século de História, moldada na Mística Corinthiana. E o papel da Fiel Torcida Corinthiana é exatamente o mesmo de sempre; ser a raiz que produz a seiva desta árvore gigantesca.

Sob o clarão do Cometa... Debaixo da luz de um lampião a gás... À luz de velas...

Na luz dos rojões estourados no céu... No clarão dos sinalizadores acesos em nossas Arquibancadas...

Ali nascem as chamas claro-escuras de nossa Bandeira Alvinegra. Um Amor que surge na voz e na mobilização de uma verdadeira Nação. A verdadeira Religião do Povo, “manifestação palpável do anseio popular por emancipação”...

A Fiel Torcida que concretizou a Utopia de ter seu Club de Verdade completa cem anos de Resistência.

Nossa História é nossa maior Glória, incontável e mitológica.

O Corinthians não conquista vitórias apenas para alimentar sua vaidade ou para fazê-las constar em manuais de história.

O Corinthians busca o título para dá-lo ao Povo, como prova de carinho, como a corda mi do cavaquinho de Adoniran.

O Corinthians conquista suas Glórias para que o Povo dê sentido à vida, e para que as pessoas simples descubram que a vida vale a pena.

Obrigado, Corinthians, por nos escolher. A vida, por ti, é o mínimo que lhe oferecemos.

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